Mercado
A organização do Sistema Nacional de Gás Natural (SNGN) assenta fundamentalmente na exploração da rede pública de gás natural, constituída pela Rede Nacional de Transporte, Instalações de Armazenamento e Terminais de GNL e pela Rede Nacional de Distribuição de Gás Natural.
O Sistema Nacional de Gás Natural (SNGN) não dispõe de produção local, ou seja, Portugal não possui jazigos de gás natural que se possam explorar. O aprovisionamento de gás natural para o mercado português é efetuado através de entradas no sistema por via das interligações transfronteiriças por gasoduto e do terminal portuário de Sines GNL (gás natural liquefeito).
O aprovisionamento realizado através das interligações está fundamentalmente centrado na contratualização através da existência de obrigações de aquisição e de pagamento de quantidades consumidas ou não (cláusula de take or pay). O fornecimento através do terminal de GNL está maioritariamente assente em contratos de GNL com a Nigéria.
O requisito take or pay inerente aos contratos pressupõe a aquisição de uma quantidade pré-acordada de gás natural durante o período de vigência do contrato. Estes acordos têm geralmente uma duração igual ou superior a 20 anos, com possibilidade de renegociação.
Como as transações ocorrem através da celebração de contratos bilaterais de natureza confidencial, não há informação pública sobre este mercado. Os agentes de mercado podem proceder à troca de existências no terminal de GNL, nas infraestruturas de armazenamento subterrâneo ou no denominado Virtual Trading Point, sendo este último o ponto que concentra maior liquidez de transações.
No mercado grossista de gás natural em Portugal, ainda não existe uma referência de formação de preço assente num mercado organizado e regulamentado, semelhante ao existente na eletricidade. Não obstante o MIBGAS, S.A. — entidade gestora do mercado ibérico organizado de gás cotado — ser reconhecido pelo governo português como a entidade gestora do mercado organizado de gás a contado, a negociação de produtos nesta plataforma, que se iniciou em dezembro de 2015, ainda está limitada a produtos com entrega em Espanha.
O processo de liberalização do setor do gás natural determinou a abertura da comercialização ao mercado, podendo qualquer consumidor escolher livremente o seu fornecedor. No que diz respeito ao preço, as condições do mercado retalhista são condicionadas pela evolução do mercado grossista, já que este último determina uma parte substancial dos custos relativos ao fornecimento de gás natural. Deste modo, a criação e o desenvolvimento do mercado ibérico do gás natural é da maior importância para os consumidores e comercializadores de ambos os países.
Mercado Ibérico de Gás Natural (MIBGAS)
A criação e desenvolvimento do mercado ibérico do gás natural, com a consequente integração dos sistemas gasistas de Espanha e de Portugal, assume particular relevância para os consumidores e comercializadores de ambos os países. Tendo em conta a importância da capacidade de receção de gás natural liquefeito (GNL) da Península Ibérica nos contextos europeu e mundial, é possível perspetivar a afirmação do Mercado Ibérico de Gás Natural como mercado de referência a nível internacional.
O acesso a todos os agentes em condições de igualdade de tratamento, de transparência e de objetividade deverá ser assegurada, a breve prazo, no MIBGAS. O quadro jurídico para o seu desenvolvimento deve ser estável, e estar em linha com a legislação e regulamentação europeia aplicável.
A criação do MIBGAS tem os seguintes objetivos:
- Aumentar a segurança de fornecimento, através da integração dos mercados e da coordenação de ambos os sistemas do sector do gás natural e do reforço das interligações;
- Aumento da concorrência, refletindo a maior dimensão do mercado e do número de participantes;
- Simplificar e harmonizar o quadro regulatório de ambos os países;
- Incentivar a eficiência das atividades reguladas e liberalizadas, bem como a transparência do mercado.
O processo de harmonização e construção do MIBGAS tem sido desenvolvido de forma gradual e de mútuo acordo entre Espanha e Portugal, estando subjacente uma contribuição ativa de ambos os países na sua concretização.
No desenvolvimento do MIBGAS deverão ser utilizadas as melhores práticas de transparência, procurando-se o envolvimento de todos os interessados, através da utilização sistemática de processos de consulta pública.
Foi nesse contexto que ocorreu a publicação da Diretiva n.º 14/2020 de 30 de setembro, que aprova as regras de negociação de produtos com entrega no VTP na plataforma MIBGAS e procedimentos associados, tornando possível a negociação em mercado organizado de produtos de gás natural com entrega em Portugal.
O arranque dessa negociação, na mesma plataforma que é utilizada em Espanha, e com regras muito semelhantes às que vigoram para produtos com entrega nesse país, é um importante passo para o desenvolvimento do mercado nacional de gás natural e para a sua integração com o mercado do país vizinho, na perspetiva do desenvolvimento futuro de mecanismos adicionais de integração de mercado, nomeadamente, do tipo de atribuição implícita de capacidade de interligação, num contexto de regras únicas para ambos os países, que contribuam para uma formação de preços mais robusta e transparente.
Organização e princípios de funcionamento
Na sequência do compromisso assumido no âmbito do ”Plano de Compatibilização da regulação do sector energético entre Espanha e Portugal”, assinado pelos Governos Português e Espanhol a 8 de março de 2007, a ERSE e a sua congénere espanhola (então CNE - Comisión Nacional de Energía, atual CNMC - Comisión Nacional de los Mercados y la Competencia) realizaram uma consulta pública sobre o Modelo de Organização e os Princípios de Funcionamento do MIBGAS, com o objetivo de receber dos agentes de mercado e demais interessados as suas opiniões, previamente à tomada de decisão. Na sequência deste processo, a ERSE e a então CNE elaboraram uma proposta de modelo de funcionamento do MIBGAS.
Em 18 de janeiro de 2012, a ERSE e a CNE apresentaram um estudo conjunto sobre as tarifas de acesso às interligações das redes de transporte de gás natural entre Espanha e Portugal, com o objetivo de identificar medidas que promovam a harmonização das tarifas e removam outros obstáculos à comercialização de gás.
Em julho de 2014, a ERSE e a CNMC realizaram de forma coordenada uma nova consulta pública sobre modelos de integração dos mercados de gás natural de Portugal e de Espanha adequados à criação de um mercado organizado de forma a garantir a liquidez e competitividade necessária à região ibérica baseados em (i) Área de Mercado, (ii) Mercado regional e (iii) Mercado integrado com alocação implícita de capacidade, no qual resultou num modelo de alocação implícita de capacidade transfronteiriça.
Atribuição coordenada de capacidade na interligação
O código de rede europeu sobre atribuição de capacidade em redes de transporte de gás (CAM), publicado pelo Regulamento UE 984/2013 e alterado pelo Regulamento UE 2017/459, da Comissão, estabelece as regras comuns de atribuição de direitos de capacidade nas interligações de gás do mercado interno europeu.
O código de rede CAM determina os produtos de capacidade standard (anual, trimestral, mensal, dia seguinte e intradiário) e os mecanismos de atribuição, através de leilões realizados numa plataforma eletrónica. Os operadores das redes de transporte em Portugal e Espanha aderiram à plataforma PRISMA, através da qual os comercializadores fazem as reservas de capacidade.
A capacidade na interligação Portugal-Espanha é atribuída no ponto virtual de interligação (VIP Ibérico). Os direitos de capacidade atribuídos aos agentes de mercado podem ser transacionados com outros agentes (mercado secundário de direitos de capacidade).
A capacidade atribuída na interligação é publicada pelo Gestor Técnico Global, juntamente com a atribuição nos restantes pontos relevantes do sistema de gás.